terça-feira, 27 de setembro de 2011

A EXPEDIÇÃO THAYER

O século XIX é considerado como o século do romantismo. Segundo Kury (1998), o viajante estrangeiro que estivera no Brasil era "portador de um olhar civilizado dirigido aos trópicos, capaz de classificar e hierarquizar o que vê", a percepção do "naturalista estrangeiro inspirou parte da elite local em sua tarefa de forjar uma identidade para a nação brasileira" que influenciou nas artes, na literatura e na história. Nesse mesmo processo da busca da identidade e de se definir um conceito de nação, buscaram-se na ciência, literatura e história sustentáculos para se construir a imagem do Império.
         No decorrer de todo o século XIX, as viagens de exploração e descrição do interior do continente foram de importância significativa para o processo de reconhecimento do país, seja instrumental, na confecção de mapas, documentação, contatos iniciais, desenhos; seja ideológico. Segundo Kury, “a viagem é em geral considerada pela história natural como uma das etapas necessárias para a transformação da natureza em ciências” (KURY, 2001:865), delas participavam cientistas, naturalistas, desenhistas e pintores.
            As expedições e a presença de cientistas marcaram o Brasil no século XIX. A criação do IHGB agregou forças para incentivar a exploração que se consolidou na segunda metade do século. O Imperador Pedro II apoiava as viagens científicas, tendo inclusive ele próprias participado de algumas.
A expedição Thayer estimulou outras expedições americanas em terras brasileiras, agora chefiadas pelo Geólogo Charles Frederic Hartt (1840-1878) - expedições de Morgan em 1870 e 1871. Na primeira expedição, Hartt e sua equipe, constituída de alunos da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, percorreram os vales do Amazonas, Tocantins, Tapajós, Xingu e a costa entre o Pará e a Bahia, realizaram estudos em geologia, e também contribuíram em estudos sobre a arte indígena e no campo da etnologia. Em 1871, Hartt voltou ao Brasil, agora acompanhado de Orville Derby e regressaram ao Amazonas.
A presença de Hartt no país contribuiu para incentivar movimentos voltados para as ciências. Por iniciativa sua, criou-se a Comissão Geológica do Brasil em 1875, considerada, segundo Figueirôa (1997, p.150), “como a primeira iniciativa institucional, de abrangência nacional, no âmbito específico das ciências geológicas no Brasil”. Subordinada ao Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, a Comissão Geológica visava ao reconhecimento do território para oferecer melhorias de infra-estrutura (estradas de ferro, armazéns, portos, etc), para atender as necessidades voltadas para a agricultura e assentar a mão-de-obra imigrante que vinha trabalhar nas lavouras, “favorecendo que o governo e as elites percebessem a oportunidade de se estabelecer no Brasil a exploração regular e sistemática do território” (FIGUEIRÔA, 1997, p.151).
Hartt então adotou o Brasil para as suas investigações científicas, “estudando-o sob os mais diversos enfoques e estimulando seus discípulos a prosseguirem e ampliarem seu trabalho” (FIGUEIRÔA, 1997, p.151). Os discípulos mais conhecidos são Orville Adalbert Derby e Jonh Casper Branner. Com a dissolução da Comissão, em 1876, Hartt1 passa a dirigir a Seção de Ciências Físicas, Mineralogia, Geologia e Paleontologia Geral do Museu Nacional, trabalhando nessa Instituição até seu falecimento em 1878. Derby também vai trabalhar no Museu Nacional no mesmo período, local em que Theodoro Sampaio veio a conhecê-lo. Theodoro trabalha no Museu de 1875 até seu ingresso na CHI em 1879.
Com esse pequeno panorama de algumas das expedições que ocorreram no século XIX no Brasil sob a tutela, em alguns casos, dos conhecimentos humboldtianos, chegamos nessa digressão a Charles Frederic Hartt, naturalista romântico, mentor do naturalista Orville Derby que fora grande incentivador e amigo de Theodoro Sampaio. Isso nos levou a considerar Theodoro Sampaio um cientista, viajante naturalista e romântico que desenhava e descrevia com sensibilidade aquilo que lhe era visto, sentido e percebido, o que era evidenciado nas descrições e nos desenhos do seu trabalho na CHI.

Referências Bibliográficas


FIGUEIRÔA, Silvia Fernanda de Mendonça. As Ciências Geológicas no Brasil: uma história
social e institucional, 1875-1934. São Paulo: HUCITEC, 1997.

KURY, Lorelai. Viajantes-naturalistas no Brasil oitocentista: experiência, relato e imagem. In: Hist.
cienc. saude-Manguinhos., Rio de Janeiro. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702001000500004
&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 15 de Agosto de 2011.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Teodoro Sampaio: Primeiro Negro Geólogo-Geógrafo!



Teodoro Sampaio viveu e trabalhou em São Paulo (1886-1903), participou da fundação da Escola Politécnica e do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, dirigiu os trabalhos de abastecimento e saneamento do estado e, antes desses fatos, na condição de “primeiro-ajudante” do geólogo Orville Derby (diretor da Comissão Geográfica do Estado de São Paulo), foi responsável pela primeira expedição de exploração dos rios Itapetininga e Paranapanema. Filho de uma mãe escrava (Domingas da Paixão) e um padre (Manoel Fernandes Sampaio), que, nascido em 7 de Janeiro de 1855, sob o teto de uma capela no engenho Canabrava, no então Recôncavo de Santo Amaro, dali sairia aos nove anos, levado pelo pai, para estudar e se formar engenheiro em 1877, pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro, vindo posteriormente a comprar as cartas de alforria de pelo menos dois dos seus irmãos, e a intermediar a libertação de um terceiro, que viviam na condição de escravos nas plantações de cana-de-açúcar da terra onde nasceram.
Publicou, na Revista de Engenharia, do artigo “A respeito dos caracteres geológicos do território compreendido entre a cidade de Alagoinhas e a do Juazeiro pelo trajeto da linha de ferro em construção”. O trabalho foi escrito a pedido do geólogo Orville Derby, que o comenta e considera interessantíssimo. Também para Orville Derby seriam escritas, no mesmo ano de 1884, as Notas sobre a geologia da região compreendida entre o rio S. Francisco e a Serra Geral (do Espinhaço) nas imediações da cidade do Juazeiro. Ainda sobre a natureza da região em que trabalhara como engenheiro, e atendendo à solicitação do geólogo John Casper Branner, Teodoro Sampaio escreveu as notas As rochas arqueanas na Bahia, consideradas “muito interessantes e muito satisfatórias”. Branner incluiu outros seis trabalhos de Teodoro na “Bibliography of the geology, mineralogy and paleontology of Brazil” e, posteriormente, no Resumo da geologia no Brasil, para acompanhar o mapa geológico do Brasil, afirmou que o mapa geológico publicado no “Atlas dos Estados Unidos do Brasil pelo engenheiro Teodoro Sampaio”, em 1911, era um dos melhores mapas geológicos do país. Além disso, na parte referente à Bahia, Branner utilizou como uma de suas bases os mapas de Teodoro e as notas sobre geologia que este tomara durante a viagem que fez como engenheiro da Comissão Milnor Roberts.
Em 1886, Teodoro fora convidado por Orville Derby para ocupar o cargo de primeiro-engenheiro da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo, que seria criada naquele ano e teria o geólogo como seu primeiro diretor. Esse convite resultaria na fixação de Teodoro no estado de São Paulo por quase vinte anos. Em São Paulo ele consolidaria a sua carreira profissional e se veria envolvido diretamente nos sucessos daquele período particularmente importante de crescimento, ampliava seu peso econômico e político e implementava o seu próprio modernizador.
Parte de um quadro maior de ampliação dos espaços institucionais de importância para a prática científica no Brasil, em São Paulo, nas duas últimas décadas do século XIX e no início do século XX, foram criadas várias instituições ligadas às atividades científicas, das quais são exemplo: a Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo (1886), o Instituto Agronômico da Campinas (1887), o Instituto Bacteriológico de São Paulo (1892), a Escola Politécnica de São Paulo (1893), o Museu Paulista (1894) e o Instituto Butantã (1901). Para fazer funcionar essas instituições era necessário contratar profissionais e, nesse período, vieram para São Paulo geólogos, como Orville Derby, Francisco de Paula Oliveira, Gonzaga de Campos e Eugênio Hussak; químicos, como W. F. Dafert; engenheiros , como Teodoro Sampaio e Euclides da Cunha; botânicos, como Alberto Loefgren; zoólogos, como Hermann Von Ihering; médicos, como Adolfo Lutz e Vital Brasil etc.
A capital refletia bem as mudanças pelas quais passava o estado de São Paulo. Richard Morse considera que as décadas de 1880 e 1890 viram São Paulo perder a aparência colonial e tornar-se uma cidade completa. No país, a cidade passara do décimo para o segundo lugar em tamanho. O número de habitantes saltara de 44.030 em 1886 para 192. 409 em 1893. A partir de 1898 até o seu pedido de demissão, em 1903, foi engenheiro-chefe da Repartição de Águas e Esgotos de São Paulo. Juntamente com Sales Oliveira e coronel Jardim, Teodoro integrou a comissão encarregada da elaboração do regulamento da fundação da Escola Politécnica de São Paulo. Segundo se depreende de uma carta de Reinaldo Porchat para Euclides da Cunha, em 1893 Teodoro chegou a ser dado como nomeado para assumir uma cadeira da Escola Politécnica de São Paulo, mas isso não chegou a se concretizar.
Também esteve entre os fundadores e ocupou lugar de destaque no IHGSP, tendo sido, inclusive, um dos três sócios que apresentaram o nome de Euclides da Cunha para o sócio do instituto (os outros o geólogo Orville Derby e o botânico Alberto Loefgren). O Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo foi criado em 1894, seguindo basicamente o modelo adotado pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro no que diz respeito à ênfase num conhecimento patriótico e cívico da nação, mas diferenciando-se deste ao destacar uma suposta especificidade paulista, o que explicaria a afirmação: “A história de São Paulo é a própria história do Brasil”.
O conhecimento de Teodoro sobre os sertões baianos seria a base que o levaria a exercer influência sobre as leituras científicas de Euclides da Cunha, que foi reconhecida por autores como Capistrano de Abreu, Gilberto Freyre, Sylvio Rabello, Olímpio de Souza Andrade e Nelson Werneck Sodré.
Quando aconteceu o desastre da Expedição Moreira César, em 1897, durante a Guerra de Canudos, Euclides da Cunha participou de uma conversa sobre a questão, na casa de Teodoro Sampaio, e teria levado deste algumas notas sobre as terras do sertão baiano. Um mapa de autoria de Teodoro, “Trecho da carta da Bahia”, então inédito, foi fornecido a Euclides da Cunha quando, em 1897, este escreveu o seu primeiro artigo (“A nossa Vendéia”) sobre a Guerra de Canudos. A autorização para que Euclides da Cunha fizesse a cópia do mapa foi dada com a condição de que ele não fosse divulgado, o que não se cumpriu, gerando a convocação de Teodoro para uma conferência com Campos Sales, governador de São Paulo. Por se tratar de mapa de uma região ainda pouco conhecida, onde o exército já sofrera sucessivas derrotas, o governador fez mais de uma cópia e as enviou para o Ministério da Guerra, no Rio de Janeiro.
Teodoro Sampaio faleceu na ilha de Paquetá (RJ), no dia 15 de outubro de 1937, aos 82 anos. Construindo uma trajetória profissional e intelectual que foi a grande impulsionadora de sua ascensão social. O livro O rio São Francisco e a Chapada Diamantina baseia-se no texto publicado pelo IHGB, valorizando pelo prefácio de Teodoro Sampaio.

Referência Bibliográfica:
SAMPAIO, Teodoro. O rio São Francisco e a Chapada Diamantina. [org.] José Carlos Barreto de Santana – São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

domingo, 27 de março de 2011

Capistrano de Abreu(1853-1927): historiador autodidata



Para a Geografia, Capistrano foi o primeiro historiador brasileiro a se utilizar da geografia para tentar explicar o processo histórico do país. Para ele, o clima, o solo e a alimentação contribuem de maneira inigualável para a formação do homem e da sociedade. Ele nos conta que os primeiros séculos, existiram algumas cartas geográficas e roteiros que descrevem a costa brasileira. Que entre 1750 e 1777, chegaram aqui geógrafos, astronomos e naturalistas, embora seus escritos tenham sido restritamente divulgados. Já no século XIX, outros viajantes tentavam conhecer o Brasil e a partir da segunda década desse século, o governo já mandava fazer explorações, até que em 1860, uma comissão científica norte-americana visitou o Brasil. Por fim, Capistrano em 1884, sugere um trabalho de geografia brasileira (exploração de rios, do litoral, pontos do interior, a geografia botânica e zoológica, a geologia, a distribuição dos índios são mais bem conhecidas).
Seguidor fiel do Positivismo, foi influenciado por alguns cientistas estrangeiros como Spencer, Darwin, Comte, Taine e Buckle. Atuou como professor de francês e português no Colégio Aquino e trabalhou uma boa parte da sua vida na Biblioteca Nacional, mas começou a ficar famoso por protagonizar uma polêmica com o sergipano Silvio Romero.
E publicou artigos criticando um texto de Romero, intitulado “O caráter nacional e as origens do povo brasileiro”, de acordo com o qual o brasileiro seria distinto do português, não por causa da natureza ou da mistura com os indígenas, mas pela presença dos negros. E afirmou a importância do meio na formação da nacionalidade brasileira e ressaltando o papel do índio. Seu maior interesse foi acessar a história dos índios por meio do estudo linguístico. É a partir desse prisma que produz trabalhos nas áreas da linguistica e da etnografia. Por que para Capistrano explicar a formação da nacionalidade brasileira através de um espaço específico que é o sertão e estudar a fundo as tradições indígenas (línguas e costumes ) era fundamental para a compreensão das migrações populacionais e, por conseguinte, do povoamento do território, para pensar sobre o brasileiro e a formação da nacionalidade.
Conheceu o geográfo Teodoro Sampaio (1855-1937), autor de “O Tupi na geografia Nacional” (1901) e do “Dicionário Histórico, Geográfico e Etnográfico” (1922). É o mesmo geográfo que ajudou Euclides da Cunha com “Os Sertões”. E por curiosidade, elogiou o trabalho “Viagem pelo Brasil” escrito pelos alemães Spix e Martius, considerou como esplêndido. E mesmo não contribuindo muito no campo da geografia, ele é considerado como um grande erudito na área da história.

Referências Bibliográficas:
GONTIJO, Rebeca. “Capistrano de Abreu, Viajante”. Revista Brasileira de História; v.30; nº59; p.15-36 – 2010.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Trajetórias iniciais

Trajetórias Intelectuais inspira narrativas e experiências com a linha da “História do Pensamento Geográfico”. Nesta ferramenta de comunicação ilustraremos idéias, pensamentos, obras de intelectuais (não necessariamente escritas por geógrafos) que fizeram parte da elaboração de conteúdos enriquecidos de conhecimento geográfico. Dentro das instituições de pesquisas encontram-se um acervo incrível de materiais, de cunhos documentais, trazendo a tona visões de mundo e como se atrelam a contextos históricos, dando base reflexiva para compreender o que é a Geografia hoje. Como geógrafa, tenho interesse de desvendar o “mosaico” que parece ser o Pensamento Geográfico Brasileiro. Desta forma não arriscaria ter a pretensão de dizer que solucionarei todos estes desafios que envolvem a história do pensamento geográfico brasileiro, mas por saber que poucos geógrafos desenvolvem pesquisas nesta linha é que despretensiosamente submirjo em busca de respostas que desvendem e caracterizem o que conhecemos hoje como Geografia Brasileira. Os motivos são inúmeros pelos quais me empenho nesta caminho e as dúvidas também. Por isso muitos se questionam:
 “Será que irei saber interpretar um texto de HPG? É um tema difícil? E será que existe alguém que gosta de saber o que os intelectuais debatiam durante o século passado? Por que é preciso saber do Brasil no passado?”
 Sendo um tema raro ou despercebido pela maioria dos geógrafos isso só contribui com a falta de uma reflexão de temas e questões geográficas que constitui na historiografia nacional. E o meu objetivo é compartilhar interesses ou críticas dessas obras clássicas que deveriam ser lidas por todos. Não abdico das dúvidas para o meu sucesso com esse blog, não sei se será visitado. Só sei que ponho em prática uma habilidade que tenho muito pouco: o ato de escrever. Estou começando a engatinhar agora e a caminhada tende a ser  longa e árdua.